Uma das diferenças mais importantes entre o Alcorão e a Bíblia é a que
se refere ao direito de herança à propriedade de parentes mortos. A
postura bíblica foi sucintamente descrita pelo Rabino Epstein: "As rígidas
tradições desde os tempos bíblicos não dão aos membros femininos de
uma casa, esposa e filhas, o direito de sucessão ao patrimônio familiar.
Nos esquemas mais primitivos de sucessão, os membros femininos da
família eram considerados parte do patrimônio e tão remoto seu direito
na herança quanto o de um escravo. Ao passo que na lei Mosaica, as
filhas eram admitidas na sucessão, no caso de não haver homem com
esse direito, embora a esposa não tivesse reconhecido esse direito,
mesmo em condições semelhantes" (1). Por que as mulheres eram
consideradas como parte do patrimônio familiar? O Rabino Epstein
respondeu: "Elas são propriedades dos pais, antes do casamento; e
depois, dos maridos" (2).
As regras bíblicas de herança estão sublinhadas em Números 27:1/11.
Uma esposa não tem participação no patrimônio de seu marido, enquanto
que ele é seu primeiro herdeiro, mesmo antes de seus filhos. Uma filha
pode herdar somente no caso de não existir herdeiros masculinos. A mãe
não é herdeira, enquanto que o pai é. Viúvas e filhas, no caso de existirem meninos, ficavam por conta dos herdeiros masculinos para o
seu sustento. Por isso que as viúvas e órfãs estavam entre os membros
mais destituídos da sociedade judaica.
O cristianismo seguiu estes padrões por muito tempo. Tanto as leis civis
como as eclesiásticas impediam as filhas de dividirem com seus irmãos o
patrimônio do pai. Além disso, as viúvas eram privadas de qualquer
direito à herança. Estas leis iníquas sobreviveram até o final do século
passado (3).
Entre os árabes pagãos antes do Islam, os direitos de herança eram
confinados exclusivamente aos parentes masculinos. O Alcorão aboliu
todos esses costumes injustos e deu a todos os parentes femininos
participação na herança:
"Às mulheres também corresponde uma parte do que tenham deixado os
pais e parentes, quer seja pequena quer seja grande, uma quantia
determinada" (4:7).
As mães muçulmanas, esposas, filhas e irmãs receberam o direito à
herança 1300 anos antes de os europeus reconhecerem sequer que
aqueles direitos existiam. A divisão da herança é um assunto vasto, com
uma grande quantidade de detalhes (4:7,11, 12, 176). A regra geral é que
a parte da mulher é a metade do que o homem recebe, exceto nos casos
em que a mãe recebe parte igual a do pai. Se tomada isoladamente, esta
regra geral referente a homens e mulheres pode parecer desfavorável. A
fim de compreendermos a razão por detrás desta regra, devemos ter em
conta o fato de que as obrigações financeiras do homem muçulmano
excedem em muito às obrigações das mulheres (ver a seção "A
Propriedade da Esposa"). Um noivo deve providenciar para sua noiva o
presente de casamento. Este presente se torna posse exclusiva da noiva e
permanece assim, mesmo que mais tarde venha a se divorciar. A noiva
não tem obrigação de presentear seu noivo. Além disso, os maridos
muçulmanos são onerados com a manutenção de sua esposa e filhos. A
esposa, por outro lado, não é obrigada a socorrê-lo no cumprimento
daquela obrigação. Sua propriedade e ganhos são para seu uso exclusivo,
a não ser que ela voluntariamente os ofereça a seu marido. Além disso,
todo mundo percebe que o Islam advoga veementemente a vida familiar.
Ele encoraja fortemente os jovens a se casarem, desencoraja o divórcio e não vê o celibato como uma virtude. Numa verdadeira sociedade
islâmica, a vida familiar é a norma e a vida de solteiro é uma exceção
rara. Quer dizer, todos os homens e mulheres em idade de se casarem são
casados na sociedade islâmica. À luz desses fatos, pode-se perceber que o
homem muçulmano, em geral, tem uma grande responsabilidade
financeira e que, por isso, as regras de herança significam uma
compensação para este desequilíbrio, de forma que a sociedade possa
viver livre de todas as lutas de classe ou de sexo. Após uma simples
comparação entre os direitos e deveres financeiros da mulher
muçulmana, uma muçulmana inglesa concluiu que o Islam tratou as
mulheres não só favoravelmente, mas também generosamente (4).
Fonte: A mulher no Islam المراه في الإسلام
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Epstein, op. cit., p. 175.
2. Ibid., p. 121.
3. Gage, op. cit., p. 142.
4. B. Aisha Lemu and Fatima Heeren, Woman in Islam (London:
Islamic Foundation, 1978) p. 23.
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